A Rebeldia Responsável
No último domingo, honrei o show do Dead Fish com a minha presença. Dead Fish assim com letra maiúscula mesmo, porque eles realmente conseguem aproximar-se da perfeição. A união de um hardcore pesado, mas ao mesmo tempo com uma forte melodia, com uma letra que impressiona pela crítica social, cantada em português faz do Dead Fish A Banda.
Apesar de ter adentrado ao glorioso mundo da MTv, a banda não perdeu suas características e continua provando que é possível fazer um som de qualidade no Brasil. Mas chega de tentar ser crítico musical e vamos ao show. O evento rolou em um clube bem pequeno da vila da penha, no melhor estilo underground. Eu adoro essa palavra: underground. Ela resume um sentido alternativo de ser, que procura fugir da ditadura de uma sociedade com gostos uniformizados. O mais estranho no entanto é que as pessoas que procuram fugir da normatização, muitas vezes formam grupos de resistências uniformizados. Dessa forma, como as pessoas adoram rotular, você é conclamado a definir-se dentro de um grupo social adequando-se ao modo de vestir, falar e ao gosto musical compartilhado pelo grupo. Eu odeio rótulos e definições precisas de gostos musicais. Eu escuto o que gosto, falo como quero e me visto da forma que eu gosto, sem estar inserido dentro de um padrão social.
Eventos do cenário alternativo carioca são ótimas fontes para estudos antropológicos. Uma forma de se vestir, que apesar de ser diferenciada, possuí em sua maioria algo em comum. Os hábitos e a forma de agir diante da música são peculiares e enfatizam a particularidade do grupo. Mas deixemos o estudo antropológico para os antropólogos.
O título desse post deveria ser “a rebeldia responsável” ou algo assim, inspirado no show do Dead Fish. Isso porque o vocalista, logo no início do show, simplesmente dispensou aquelas barreiras que normalmente separam o público do palco e conclamou todos para aproximarem-se do palco. Estabeleceu um contrato com o público baseado na proibição de se subir no palco e na advertência em relação as duas torres gêmeas de iluminação. Feito o contrato, o show iniciou-se com a tradicional roda punk no meio do salão e com os mais fanáticos pulando próximo ao palco e cantando junto com o grupo. O que poderia parecer uma completa anarquia desenrolou-se na mais perfeita ordem fundada no contrato entre o vocalista do grupo e o público. Isso lembrou-me o conceito de rebeldia responsável, que venho forjando a algum tempo. Trata-se de uma revolta fundamentada, um protesto que tenha conteúdo e que esteja atento às conseqüências dos atos. As manifestações de quebra-quebra não fazem parte da rebeldia responsável. Muito menos os atos que possam prejudicar o próximo. A rebeldia responsável é a proximidade de uma revolução da mente, fundamentada em valores coerentes. Utópica ela pode ser, mas isso não anula a sua pertinência. Mais do que nunca, a rebeldia responsável torna-se um anseio do mundo contemporâneo. Fundamentada na união, a rebeldia responsável precisa vencer o individualismo de massa dos tempos modernos, vencer a acomodação, a descrença a ilusória ordem da nossa sociedade.
Tal qual o publico do Dead Fish anarquisou com responsabilidade, temos que protestar coerentemente, tendo em nossas mentes a noção das conseqüências. Isso vale para tudo. Até mesmo para curtir a vida de uma forma louca, é preciso ter responsabilidades pois querendo ou não as conseqüências dos nossos atos sempre recaem sobre nós. Abençoada seja a rebeldia responsável.