À um fio da ex.
A fome já havia me dominado e eu estava pronto para vencê-la quando, rompendo a silêncio daquela tranqüila noite, o telefone fez questão de dar um sinal de uma vida que não tem. Do outro lado da linha, ouço uma voz que não me é estranha. Ela pergunta logo se a sua voz é reconhecida como se quisesse saber se sua dona ainda representa algo para mim. Eu dissimulo e quase me convenço de que não reconheço. Como sempre, ela diz que ligou só para saber como estão as coisas e pergunta se meu coração está ocupado. Eu não dissimulo e digo a verdade. Ela espera a réplica, mas eu a deixo esperar. Ela irrita-se afirmando que eu não quero falar com ela, despede-se e desliga o telefone. Eu, tenho a minha fome aumentada e finalmente vou em direção à sua aniquilação.
Ex- namorada é um ser estranho, bem estranho. Essa, que protagonizou o caso relatado acima eu vou chamar de X para preservar o nome. De tempos em tempos me liga para saber como estão as coisas e sempre se irrita porque eu não conto detalhes. Ela parece ser uma espécie de câmera do big brother que insiste em me filmar, só para saciar a curiosidade. Sua ligação me lembrou o telefonema de outra ex que vou chamar aqui de Y.
Essa foi mais prática e depois de quase um ano que estávamos sem nos falar, ligou para o meu celular apenas para saber como chegar em um determinado local. Eu, inocente indiquei um ônibus e ela marcou o primeiro ponto ao afirmar que estava vindo acompanhada, não de ônibus. Um a zero para ela. Eu não queria empatar o jogo e dei as instruções corretas. Quando ela me viu, caminhou em minha direção como um artilheiro correndo em direção à baliza e chutou. Jogou, isso mesmo, ela jogou o namorado para cima de mim. Esse aqui é o fulano de tal, sem nem mesmo um bom dia para quebrar o gelo. Eu apenas apertei a mão do cidadão enquanto lia nos seu olhos o que ela realmente queria me dizer:
-Ta vendo? Quem mandou você me deixar! Arrumei um bem melhor. Você aí sozinho e eu aqui com um bem melhor que você.
Até a risadinha sarcástica chegou aos meu ouvidos. O meu lado negro da força sugeriu que eu respondesse algo do tipo:
-Coitado dele, Meu pêsames camarada. Mas o conselho de jedis da minha mente, buscando manter a ordem, apenas me disse para ficar calado e no íntimo do meu coração, desejar felicidade aos dois. E foi o que eu fiz; fiquei calado, sorri e deixei o placar ficar mesmo em dois a zero para ela, afinal nem sempre se pode vencer.
Reafirmo que ex-namorada é um ser estranho, muito estranho e interiorizo a certeza de que eu preciso mudar o número do meu telefone, antes que do fundo do baú, ou melhor, do fio do telefone, surja novamente a voz de uma ex.